quinta-feira, 19 de março de 2015

Magliani - das Artes

Renato
São Paulo continua sendo o lugar onde 
as coisas acontecem para quem tem dinheiro 
para fazê-las acontecer. Talento não é o suficiente 
faz muito tempo. E em toda parte.
Há anos não tenho mais como sustentar a pintura. 
ultimamente não tenho como sustentar a mim mesma. 
A São Paulo civilizada, da qual continuo gostando muito 
ainda existe, mas não é para minha bolsa.
Não tenho saúde para esperar milagres a esta altura da globalização. 
Até quando sem dinheiro para pegar um ônibus? Como voltar de uma galeria do o
utro lado da cidade, norte, sem dinheiro para o táxi? 
Cansei de não ter condições de sair daquele lugar miserável 
em todos os sentidos onde fui parar. 
Cansei de tentar contato com pessoas que me ignoram sistematicamente. 
Cansei de passar fome, de fazer conta no bar, pra comer sanduíche. 
Cansei de pagar juros no banco por pedir empréstimo p/ comer. 
Cansei de não ver chance de ir no cardiologista, podólogo, de comprar um livro, 
ir a ópera, ao ballet, ao teatro. Contar moedas pra ir ao cinema p/ não enlouquecer (...).




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A galeria disponibilizava um espaço para leituras, com uma biblioteca dos grandes e principalmente merecidos nomes da arte, claramente fugindo da história básica. Neste meio, pedi uma indicação, de alguma coisa que ela considerasse pungente.

Não precisou de um segundo a mais para que atacasse a estante atrás de um livro. Eram tantos tão tarados que lhe saltavam em frente aos peitos, mãos, nos dedos, que volta e meia passou a se perguntar onde estaria, e lamentavelmente um "SE ainda disponível" lhe rondava o texto. Até que felizmente encontrou.

Buscou nas páginas alguma entrevista que pela empatia disse sem qualquer chance de erro: tu vais adorar! No entanto, o livro tb a traia e nada encontrava. Desistiu, entregou-me dizendo que precisava conferir por inteiro.

Sentei na poltrona e a primeira imagem/obra já me deu sede de tudo: quero ver! quero estar na presença de um destes!!! Fui revirando, revirando,..., até que me deparei com esta carta que me ceifou o peito: quão amargo estava sendo aquele instante?!? Precisaria de mil câmeras para ordenar/gravar as mensagens visuais que me passaram e se confundiram com um choro impossível de conter.

Além de toda a poética visual, a fala daquela mulher me pegou pra sacolejar nas mais diversas sensações. Tentei me pensar negra, artista, moça, senhora, mulher. No desejo, no amor, nas sistemáticas formas de ser ignorada sem encontrar qualquer vestígio pelo qual pudesse perceber meus erros e acertos, encantos e desencantos.... Sobrando de forma evidente este Amor pela arte em meio a um desespero momentâneo.

Nas páginas que se seguiram fui saindo daquela amargura, pra encontrar um apuro, um delírio de cores da auto-representação, agudez, força, pensando nas formas distorcidas, nos tons escuros... 
Daí quando hoje me encontro com uma obra sua, por mais difícil que me seja, gosto de fantasiar que ainda vou tomar um café com ela, escrever uma mensagem para que leia posteriormente,..., dar um agrado pq não sei o que fazer com toda a vontade que brota em mim por sua causa, por sua obra.
Aí eu fantasio enquanto deixo ela entrar a seu próprio tempo.